Ela fez da preocupação com o planeta sua jornada de vida e está à frente da MateriaLab, empresa de consultoria de gestão ambiental e tecnologia de boas práticas
Conversar com Carol é como seguir um mapa que nos leva ao essencial da vida. Mas para chegar lá é preciso apreciar os primeiros passos
Quando criança, enquanto sua turma da escola esperava o ano todo para embarcar para a Disney, Carol jogava na mala meia dúzia de biquínis e camisetas e descia a serra com a família para passar os verões em Ubatuba, litoral de São Paulo. “Eu sempre fui assim, meio “naturalzinha” em busca da minha turma”, disse Carol em entrevista à Bazaar.
Mas para ela, praia nunca foi sinônimo de férias e preguiça, muito pelo contrário, foi perto do mar que a menina da cidade grande se descobriu verdadeiramente viva e, segundo ela, extremamente útil. Carol veio ao mundo para usar todo seu potencial humano e foi durante os longos verões no litoral norte paulista, que começou sua história de amor com o planeta. Seu primeiro “projeto” foi uma espécie de “operação praia limpa”, que nasceu do incômodo de ver lixo demais e cuidado de menos. Engajando as amigas que fez por lá e convidando um ou outro nativo que trazia não só a sabedoria local, mas também boas ideias, Carol “varria” a praia guiada apenas pela sua sensibilidade e sua intuição. (Fico imaginando o orgulho deste pai e desta mãe)!
A família sempre foi seu porto seguro e foi no colo da avó materna que, mais uma vez, sua ligação com a natureza veio à tona.
Com as mulheres da família aprendeu sobre os benefícios medicinais das ervas, o poder curativo das raízes e o potencial de uma simples semente
Mas bastou meia hora de conversa com uma “Carol adulta”, para perceber que de nada adiantaria estar cercada por bons exemplos, se não partisse dela, o genuíno interesse em salvar o mundo.
Muito se fala sobre propósito de vida, e dizem que a forma mais simples de entendê-lo, é quando nos pegamos fazendo de graça, o que poderíamos cobrar. Bingo! Carol soube fazer esta ligação e percebeu que veio ao mundo com uma missão
Mesmo sem ter a menor ideia do impacto que suas ações mirins causariam nas suas escolhas futuras, a paulistana que amava seu bem estar tanto quanto o do seu planeta, seguiu firme na direção que a transformaria em uma das primeiras estudiosas brasileiras sobre o impacto do lixo no meio ambiente.
Formada em Direito pela USP, Carol escolheu a profissão por influência do pai e porque em 1997, quando entrou para a faculdade, muito se falava sobre a “chegada” de um tal de “Direito Ambiental”, ainda extremamente insipiente. Aos poucos, a jovem que logo se mostraria uma empreendedora nata, foi ligando os pontos e construindo sua trajetória profissional. Em 2002, formada e trabalhando para uma empresa que fazia gestão de resíduos industriais, decidiu mapear todos os envolvidos no complexo processo do lixo.
“Foi neste momento que percebi que, dar um destino ao lixo, não bastava. Eu tinha que desenvolver uma forma de me comunicar com cada ser humano envolvido na cadeia da economia circular”
Carol Piccin
Este ciclo envolve o designer, a indústria, o consumidor, o catador de lixo, o planeta e muito mais”. Carol percebeu que era preciso unir a saúde humana com a saúde do planeta para, de fato, transformar nosso comportamento, “pois é na saúde humana que mora a saúde do planeta”, disse com firmeza.
Muita água rolou e em 2012 Carol fundou a MateriaLAB, uma empresa que une várias frentes: consultoria de gestão ambiental, pesquisa de materiais e tecnologias de baixo impacto ambiental e auxílio à dupla: “produção e consumo,” com o objetivo de tornar tudo isso mais eficiente. Soma-se a MateriaLAB, a Materioteca, que é uma biblioteca de materiais ecologicamente corretos, mas na verdade, o lugar é um verdadeiro laboratório de conhecimento. São mais de 500 materiais e 200 fornecedores, classificados de acordo com indicadores como: composição, características, aplicações potenciais, durabilidade, desempenho técnico e custos. Entre os materiais disponíveis, estão os couros feitos por meio da fermentação de bactérias, de cascas da batata, e (acredite) até de cactos.
Assim como muitos estudiosos mundo a fora, Carol afirma que “o lixo é um erro de design (não de “desenho” propriamente dito, mas de “desígnio”). Esse lapso resulta em excedentes e a falta de responsabilidade humana é o primeiro obstáculo a ser superado. Então é lá que quero focar, em alertar o ser humano e despertar nele um senso de responsabilidade e urgência”. Carol completa dizendo que: “os excedentes vêm sempre por uma falta nossa, e é aí que eu entro. Meu objetivo é mostrar para as pessoas que estamos todos conectados e que o efeito borboleta é literal, ou seja, o que se faz em um extremo do planeta afeta o outro e vice versa, e isso vale para cidades, praias e para tudo que existe na terra”.
Aos 42 anos, e com o mundo (finalmente) acompanhando sua precoce preocupação com as questões sustentáveis do planeta, pergunto se ela finalmente encontrou sua turma, me referindo aos diversos movimentos sustentáveis existentes hoje. Carol diz que sim, mas que sua turma definitivamente não é um nicho, e afirma:
“Este assunto deveria sumir, a palavra sustentabilidade deveria sumir. Deveríamos lidar com isso como algo intrínseco em nós, inseparável”
Carol Piccin
Se eu puder dar um nome para minha turma, diria que é a “turma do amor”. Quem ama cuida e se você tiver este sentimento genuíno pelo planeta, você é da minha turma”
Carol Piccin
Texto Dani Pizetta
Originalmente publicado na Revista Harper´s Bazaar Brasil, edição impressa de janeiro/2021, tema: sustentabilidade.