CARLA ASEVEDO. A FORÇA QUE SE VÊ NO SEU CORPO, ESTÁ TAMBÉM DENTRO DELA

A quarentena chacoalhou minha profissão, mas não minha vida mais íntima”, disse Carla Asevedo, durante um longo e profundo papo por telefone.

A professora de fly yoga – método que utiliza tecidos como base para as posturas aéreas – encarou com sabedoria os desafios humanos e profissionais desta pandemia.

Com bases sólidas nos ensinamentos orientais, Carla mergulhou ainda mais na filosofia milenar e buscou na natureza e na paz de seu namorado, o empresário Stefan Weitbrecht, suporte para encarar os desafios de 2020.

O destino de ambos? O Mato. É como chamam carinhosamente a casa de campo em Cotia da família de Stefan. É lá que, ao lado do fotógrafo Victor Collor de Mello, seu sócio no Cozinha 212, ele colhe os itens da horta orgânica que abastece o restaurante, fechado até recentemente. E foi no Mato que Carla decidiu quarentenar.

O REFÚGIO

Assim como o namorado, ela interrompeu temporariamente o seu negócio: teve de encerrar as atividades presenciais de seu ateliê de yoga, conhecido como A Casa do Budha (é um anexo da sua casa localizada na charmosa rua Sampaio Vidal, no Jardim Paulistano). A apenas 25 minutos de São Paulo, a casa de Stefan já era um refúgio para a professora nos finais de semana. “Mesmo antes da pandemia eu já dividia meu tempo entre dias na cidade e outros em meio à Mata Atlântica. Em São Paulo, eu dou aulas e me reconecto com minha individualidade. No Mato me cerco de árvores centenárias, de bichos de todos os tipos e dos cuidados do Stefan.”

 

A VIRADA DE CHAVE

Mãe de Manuela, de 22 anos, e de Lucas, de 20, toda a força que se vê no seu corpo habita também dentro dela. O yoga foi o caminho que a fez respirar e se reconectar com o planeta. Carla era arquiteta e passou de aluna à professora de fly yoga há apenas sete anos. “Eu levava uma vida tóxica”, lembra. “Mas já na primeira aula, há 20 anos, me conectei com a filosofia que trazia alento à minha rotina. Mulher fazendo obra acaba gastando o dobro da energia para provar seu valor”, disse ao relembrar o quanto seu trabalho a consumia. Mas foi ao descobrir um problema de saúde que Carla decidiu “parar o mundo e descer”. Diminuiu o ritmo, buscou alternativas holísticas para seu tratamento e aprofundou os estudos na prática que a transformou em mestre no assunto.

AS BOAS SURPRESAS DA PANDEMIA

Foi quarentenando no Mato que ela viu a demanda por aulas aumentar surpreendentemente. Longe do estúdio, a professora adaptou o método aéreo para o chão, improvisou um espaço ao ar livre entre a casa e o capril (o lugar onde dormem as cabras), abriu aulas online e se viu mais ocupada do que nunca. Mas, desta vez, colocando em prática uma de suas frases preferidas: “aquele que cura o outro, cura a si mesmo”, do psiquiatra e psicoterapeuta Carl Jung. “Teve um dia que abri uma aula online e vi um bode em cima do muro, macacos brincando nas árvores e uma família de cabras andando solta no pátio; pensei: espero que não caia nenhum macaco no meio da aula!”

AS NOVAS IDÉIAS

Mesmo ocupada, Carla pôde curtir ao extremo o silêncio do lugar e colaborou com o namorado nos afazeres da propriedade. A vida do casal é inspiradora, tanto na individualidade quanto na união. Cada um na sua, mas sempre juntos e misturados. Stefan, que cresceu na filosofia Waldforf e tem habilidade com a terra e com a cozinha, também enfrentou desafios. Com o restaurante fechado, e sabendo que a natureza não espera, Carla “cantou a bola” sobre começar o delivery de produtos frescos no melhor estilo farm to table. Stefan acionou Victor e no dia seguinte começaram a produzir cestas de orgânicos deslumbrantes para entrega em domicílio. A seleção inclui, além de legumes, frutas e temperos, pão de fermentação natural e doces caseiros. A boa notícia é que o negócio paralelo veio para ficar.

EQUILIBRIO

A Casa do Budha reabriu em setembro, o restaurante também. De volta ao esquema “meio lá, meio cá”, o casal, que aproveitou a quarentena para viver mais junto que separado, nos mostra que o equilíbrio é o melhor de todos os escapes e, seguramente, é a jornada mais divertida. Ao deixar São Paulo em direção à natureza todos os sábados, Carla leva corpo e alma abertos para voltar abastecida de ar, de leveza e de amor. Um dia perfeito no Mato, pelos olhos da instrutora de yoga, não exige muito de nenhum mortal, pelo contrário, o gostoso mesmo é se entregar ao tempo e aos pequenos prazeres da vida.

SLOW LIFE

“Amo dias de outono, céu azul e temperatura amena. Como acordo cedo todos os dias para dar aula e não tomo café da manhã, nos finais de semana eu faço o oposto: acordo tarde e minha refeição matinal é sagrada! Logo depois, acompanho o Stefan até a horta para colher nosso almoço tardio (fazemos apenas duas refeições ao dia). Levamos comida às cabras e tomamos sol. Mas se estiver frio, acendemos a lareira e eu passo a tarde com meus livros e com o Stefan deitado no meu colo recebendo um cafuné, que ele deseja… que nunca acabe.”

 

Texto Dani Pizetta

Matéria originalmente publicada na Revista Harper´s Bazaar Brasil, edição de outubro/20. Seção ‘ESCAPE’. Edição André Aloi. Fotos Victor Collor de Mello.