Uma história sobre tudo que me atrai e sobre meus pontos de vista

 


O convite da revista Harper´s Bazaar para escrever em primeira pessoa sobre meu estilo de viver, foi uma surpresa que encarei com um dos meus superpoderes: não me levar a sério

Mas antes de seguir nesta loucura que me parece exercer este papel, percebi que aceitá-lo, diz mais sobre mim do que eu poderia imaginar, por outro lado, tem a ver com o hábito de abraçar o que cruza meu caminho sem hesitar. Não que seja fácil, mas foi ficando simples com o tempo.

É preciso inventar a vida todos os dias

Me sinto wild & peaceful ao mesmo tempo (selvagem, mas em paz), essa é minha essência, e talvez, este seja um bom termo para definir meu estilo.

Transformei o desafio em uma história sobre tudo que me atrai e sobre meus pontos de vista. Um passeio mundo adentro do meu apartamento de 70m2, no térreo de um predinho, localizado em uma rua de uma quadra só, dentro da imensa cidade de São Paulo. Começarei pela peça central da minha casa: uma mesa redonda de madeira que divide a sala da cozinha. Tenho outra, mas gosto de fazer tudo aqui, inclusive trabalhar nela quando estou em casa. Sua relevância no espaço tem a ver com o fato de me permitir escolher, se dela, quero ter a vista da sala, ou da cozinha. Engraçado como mudar a perspectiva faz bem. Lembro que não gostava desta mesa cheia de marcas, mas durante a pandemia virou um “porto seguro”. Quem já esteve ao redor dela, certamente já provou meu (famoso) molho de tomates feito em casa com um toque de alecrim, digno de uma boa mamma italiana!

A novidade é que em breve a receita estará disponível em pontos específicos durante uma ou duas estações por ano, e a a ideia de transformá-lo em um produto surgiu conversando com amigos durante uma temporada que passei na França.

Vivi em Paris no início de 2022 e a experiência acelerou ideias e sonhos antigos

Um deles foi a industrialização do molho, e o outro foi a compra de uma cadeira icônica de Flávio de Carvalho (1988-73), a FDC1. Feita inteira de traços e curvas, além de linda, a peça dos anos 50 traz abre espaço na minha pequena sala pois é totalmente vasada e deixa meu apartamento “respirar”. Seu grafismo e estética conversam com tudo que tenho e o pensamento do designer por trás da obra me fascina, mas isso, é papo para outro dia, ao redor da mesa! Apesar de gostar de grafismos, geometria e fontes, gosto mais quando são orgânicas, como as gravuras de Sean Scully que estão na entrada do meu quarto e o díptico do mineiro Marcelo Drummond instaladas entre a sala e a cozinha.

Meu apartamento é reflexo de como me sinto por dentro

Tem silêncio, mas tem barulho também, e acredito que estes dois elementos podem até ser sonoros, mas aqui, são visuais também. O silêncio vem da cor branca como base para o meu quarto e para o meu quarto e sala de TV e leitura, neles, me aninho em paz. Já na sala e na cozinha, dá para sentir energia e movimento. De forma geral, tudo que tenho está a mostra. A maioria dos objetos e móveis têm funções duplas: mesas que viram bancos, livros que são obras de arte, cadeiras que viram mesas e apoios, e assim, vou inventando minha própria arte de morar.

Aprecio imensamente a qualidade de uma peça, seja pelo pensamento, pela execução, pela matéria prima ou pela estética, e isso, agrega valor a tudo que tenho e certamente, transcende o tempo

Alguns objetos me servem de lembretes, como uma gravura azul de Henri Matisse que fica sobre uma escrevinha. Sou fascinada por esta série do artista conhecida como “Nus Azuis” (The Blue Nude iii), pintadas em 1952 com o método de decupagem em guache. Em resumo, são colagens que ilustram o quão provocador um design simples pode ser.

Tenho plantas, porém o assunto não é meu forte, mas uma delas me faz rir

Ganhei uma Jiboia (a planta), e a posicionei na cozinha, ao lado de uma janela, rapidamente começou a crescer, e pensei: “olha só, ela está amando este lugar”. Mero devaneio meu, um dos galhos atravessou a janela subiu pela porta, encontrou outra janela e percebi que ela queria mesmo “era ir embora” (risos). Isso me fez lembrar  Fernando Pessoa quando escreveu: “da alma, só sabemos da nossa”. Mas no fundo, percebi que sua busca pela luz é a mesma busca que tenho pela vida, pelo bom humor, pela leveza e pelo sol.

Quanto ao meu closet, não sou consumista, mas acho que ele nunca sai de moda

Vou do linho à seda e tenho peças fluidas e outras justas, mas acredito que as fluidas mexem mais com a imaginação (de todos); e isso é lindo! Uso pouca estampa e prefiro as gráficas. Gosto de peças únicas como macacões, quimonos, caftans e vestidos atemporais. Não gosto de escolher nenhum look com antecedência, acordo e sinto. Acredito que minha liberdade sustenta meu estilo e se tem uma coisa que aprendi com o tempo é que devemos acreditar em nós mesmas mais do que todo mundo.

Eu e você somos únicas nas nossas essências e nunca mais existirá alguém como eu, ou como você. Por isso, vamos nos divertir com a moda, pois no final, moda é gostar das camadas que acumulamos, mas também, das que perdemos pelo caminho.

Matéria orinigalmetne publicada na Revista Harper´s Bazaar Brasil / Edição Setembro de 2022 / Fashionable / Fotógrafo: Christian Maldonado / Styling: Rodrigo Yaegashi / Produção de moda: Larissa Romano / Beleza: Jessyca Tommas